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MUSEU DO SERINGAL VILA PARAÍSO
Por:
Ercilene do Nascimento Silva de Oliveira
Augusto Fachín Terán
https://ensinodeciencia.cms.webnode.com.br/news/museu-do-seringal-vila-paraiso/
APRESENTAÇÃO
A cidade de Manaus tem em sua história um ciclo de desenvolvimento com legado deixado pela cultura da Borracha descrito não apenas em livros, com relatos de autores como Benchimol (1999), Araújo (2003), Teixeira (2019) dentre outros, que trazem em suas obras toda a pujança e riquezas vividas nesta época. As lembranças podem ser vistas também em forma de monumentos erguidos na capital amazonense e que notabilizam até hoje como eram os costumes daquela época áurea onde no norte havia uma Paris dos trópicos erguida sob a égide da extração do ouro branco da Amazônia, como era chamado o látex da seringueira (Hevea brasiliensis). Esta árvore nativa da região trouxe desenvolvimento para o Norte no final do século XIX e início do século XX.
Teatro Amazonas
Mas não é somente a História e a Geografia que podemos contemplar no legado do Ciclo da Borracha. Há o ensino de Ciências e toda a conjuntura que envolve a árvore símbolo desta época. Espaços educativos como museus são ambientes criados para contar estas histórias e preservá-las ao longo dos anos. Marandino (2016, p. 9) estudiosa dos assuntos relacionados ao tema, nos apresenta os museus como locais para motivar, desenvolver atividades e estabelecer diálogos. Relacionando os espaços com o ensino de Ciências, ressaltamos o pensamento de Gonzaga e Fachín-Terán (2013, p. 41) ao destacarem que estes espaços são ambientes de ensino e aprendizagem, capazes de aproximar crianças da natureza, sendo eles, potenciais ambientes para uma aprendizagem significativa. Salientamos que esses locais promovem o processo de ensino aprendizagem em crianças e jovens estudantes, e pessoas de todas as idades e são capazes de levar entretenimento e conhecimento a quem passa por suas instalações.
Ao apresentar este espaço, o nosso objetivo é mostrar o Museu do Seringal Vila Paraíso, como um ambiente educativo criado em Manaus para visitação e que além do turismo, possibilita a experiencia de ensino com foco interdisciplinar.
MUSEU DO SERINGAL VILA PARAÍSO
O Museu do Seringal Vila Paraíso (as iniciais MSVP serão usadas para designar o espaço) é um ambiente criado e administrado pela Secretaria de Cultura do Amazonas e foi inaugurado em 16 de agosto de 2002. Conforme informações do site (https://cultura.am.gov.br/portal/museu-do-seringal-vila-paraiso/), o local está aberto à visitação de terça a domingo, das 09h às 16h, com a última visita guiada iniciando às 15h. O MSVP está localizado no igarapé São João – afluente do igarapé do Tarumã Mirim, na zona rural de Manaus. O acesso é por via fluvial e pode ser feito por travessia regular com tempo médio de duração de 25 minutos, feita por lanchas da Cooperativa dos Profissionais de Transporte Fluvial da Marina do Davi (https://acamdafturismo.blogspot.com/) e com valor estipulado em R$ 14,00 por trajeto.
Museu do Seringal - Na enchente Amazônica
As instalações do museu foram inicialmente locais de gravação do filme “A Selva”, do diretor Leonardo Vieira. O longa-metragem é uma adaptação do livro do escritor português Ferreira de Castro e as filmagens deram-se entre os meses de maio e junho do ano de 2001. A trama se passa em um seringal no interior da Amazônia, onde um português que chega ao Brasil para trabalhar em um seringal, vive um romance com a esposa do dono do seringal (https://www.adorocinema.com/filmes/filme-137213/).
Casa de banho de Dona Iaiá
O MSVP é um dos ambientes com potencial pedagógico apontado pelos pesquisadores Hiléia Monteiro Maciel e Augusto Fachín-Terán em um estudo onde apresentam 10 (dez) espaços não formais institucionalizados de Manaus com possibilidades de ensino (MACIEL e FACHÍN-TERÁN, 2014).
A ambientação propícia ao aprendizado inicia no momento em que chegamos ao porto da Marina do Davi, na zona centro oeste de Manaus, nas proximidades da praia da Ponta Negra, local de onde saem as embarcações rumo ao MSVP. Casas erguidas sobre estruturas flutuantes nos relembram que as moradias surgiram em cima das águas na época do Ciclo da Borracha porque na Amazônia, como relata o estudioso André Araújo (2003) “o homem se fixa onde existe água, porque a água é a fonte mais importante para a agricultura e para a evolução da própria vida social” (ARÁUJO, 2003, p. 101).
Casa do Seringalista
Interior da casa do Seringalista
É neste cenário, em meio a casas flutuantes e embarcações regionais, que zarpamos para o MSVP percorrendo o Rio Negro que nos leva ao afluente onde está sediado o museu. Na chegada, os visitantes são recepcionados pelos guias que conduzem o percurso. São várias estações, começando pela casa do seringalista, onde é possível observarmos os costumes de moradia daquela época no meio da selva, em que se vivia com luxo e mordomias só possíveis aos donos de seringais. Alguns metros ao lado está o ambiente que retrata bem como eram as relações econômicas: trata-se da casa de aviamento, onde os seringueiros compravam mantimentos e materiais de uso pessoal a preços exorbitantes, demostrando as situações de escravidão pelas quais aquelas pessoas eram submetidas (TEIXEIRA, 2019, p. 19).
Interior da casa de aviamento
Andando um pouco mais chegamos à capela do seringal que evidencia o quão a religião era presente nos costumes sociais naquele momento histórico. Há ainda no percurso do MSVP ambientes que apresentam aos visitantes a casa de farinha, onde os seringueiros ocupavam o tempo com atividades fora do período para a extração do látex, nos momentos em que não era possível fazer a retirada da seiva das árvores. Também é possível assistir a uma demonstração feita pelos guias do museu de como era tirado o látex das seringueiras. E ao lado, experimentamos como era o ato de transformar o leite da seringa em borracha, em uma casa que simula o processo de defumação do látex extraído da seringueira.
Casa de defumação do látex
O modo de vida dos seringueiros está presente no barracão onde eles ficavam perto da casa do seringalista e também na maloca erguida em cima de árvores, no meio da selva, como medida preventiva de proteção dos animais da floresta, uma das ameaças aos seringueiros.
A biodiversidade presente no MSVP tem uma ampla diversidade de flora. A começar pela presença de vários exemplares da seringueira (Hevea brasiliensis) que é uma árvore emergente e pode chegar a 30 metros de altura e cuja produção de sementes inicia a partir dos 4 anos (https://www.ciflorestas.com.br/texto.php?p=seringueira). Com relação a produção de látex, a árvore começa a ser produtiva a partir de seu sexto ano. A Seringueira deu ao Brasil entre os anos de 1879 e 1912, o título de maior produtor mundial da borracha natural (BENCHIMOL, 1999). No MSVP o visitante poderá também ver como é a fabricação da farinha de mandioca / macaxeira (Manihot esculenta) que é uma planta da mesma família botânica da seringueira. A característica da família Euforbiácea é o caule que apresenta uma substância latescente com um látex branco ou colorido (https://www.ipef.br/identificacao/hevea.brasiliensis.asp). Sem contar as árvores frutíferas presentes no espaço, como por exemplo, o cupuaçu (Theobroma grandiflorum), o araçá-boi (Eugenia stipitata) dentre outras espécies.
Casa de fabricação da farinha
O MSVP já serviu de ambientação para diversos estudos que demostram como ele pode ser usado para a divulgação científica, o ensino de Ciências, além das atividades regulares ligadas ao turismo. Dentre as pesquisas relacionadas podemos destacar duas publicadas em 2018 por integrantes do Grupo de Estudos e Pesquisa Educação em Ciências em Espaços não Formais (GEPECENF). Em uma delas, com título “O potencial pedagógico do Museu do Seringal Vila Paraíso para o Ensino de Ciências”, (https://ensinodeciencia.webnode.com.br/products/museu-do-seringal-vila-paraiso/), os pesquisadores evidenciaram o potencial do MSVP para o desenvolvimento de atividades interdisciplinares nos diversos ambientes que dispõe e onde é possível fazer atividades de disciplinas relacionadas à História, Geografia e Ciências Naturais. No outro artigo intitulado “A história da exploração da seringa (Hevea brasiliensis) e o ensino de Ciências no museu do seringal Vila Paraíso”, é relatada a vivência de uma visita feita ao MSVP com um roteiro pré-elaborado onde foi demonstrado que o ambiente é fonte de aprendizado sobre o tema da exploração da seringa com os diversos elementos que formam o itinerário de visita ao local.
Extração do látex da seringa
Verifica-se, assim, que o MSVP é um dos espaços não formais de Manaus onde é possível conhecer como era o modo de vida em um seringal na época do ciclo da borracha, em uma visita onde é possível interagir com os diversos ambientes e vivenciar como eram as condições de vida dos seringueiros, seringalistas e demais personagens envolvidos nesta história de riqueza e poder que trouxe muito luxo à região Amazônica e que deixou um legado ao seu povo com um latente material que pode ser explorado tanto com o viés turístico quanto como recurso natural para o ensino e a aprendizagem em ambientes educativos fora da sala de aula.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, A. V. Introdução à Sociologia da Amazônia. 2 ed. Revista – Manaus: Editora Valer / Governo do Estado do Amazonas / Editora da Universidade Federal do Amazonas, 2003.
BENCHIMOL, S. Amazônia: Formação Social e Cultural.Manaus: Valer / Editora da Universidade do Amazonas, 1999.
GONZAGA, L. T.; FACHÍN-TERÁN, A. Espaços não formais: contribuições para educação científica em educação infantil. In FACHIN-TERAN, A; SEIFFERT SANTOS, S. Novas perspectivas de ensino de ciências em espaços não formais. Pp. 41-52. Manaus: UEA edições, 2013.
MACIEL, H. M.; FACHÍN-TERÁN, A. O potencial pedagógico dos espaços não formais da cidade de Manaus. Curitiba, PR: CRV, 2014. 128p.
MARANDINO, M. et. al. A Educação em museus e os materiais educativos. São Paulo: GEEF/USP. 2016.
SILVA, F. S.; SANTOS, S. D. F.; FACHÍN-TERÁN, A.; OLIVEIRA, L. S. J. O Potencial Pedagógico do Museu do Seringal Vila Paraíso para o Ensino de Ciências. Revista Amazônica de Ensino de Ciências, Manaus, v.14, n.24, p. 186-206, ago-dez, 2018.
TEIXEIRA, C. C. Servidão humana na selva: o aviamento e o barracão nos seringais da Amazônia. 2 ed. Manaus: Editora Valer, 2019.